quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Machina Speculatrix: contratação colectiva e cenários de cidadania.

Machina Speculatrix: contratação colectiva e cenários de cidadania.: Para dizer ao que venho, tenho, antes, de explicar uma pequena peça da maquinaria social e institucional da contratação colectiva. A coisa ...

Tens razão, mas a coisa é mais difícil do que parece; e essa prática de não publicar ou atrasar sistematicamente a publicação das portarias de extensão, já foi usada nos anos 80 e 90 por vários governos. Mas a hipóptese sugerida de "castigar" aqueles trabalhadores (tese com que não concordo) que, por comodismo ou calculismo, não estão sindicalizados, esbarra com o princípio constitucional -art. 59º, nº 1, al. a) da CRP -de que a trabalho igual deve corresponder salário igual, ainda que este princípio não tenha aplicação fácil, atendendendo a que o trabalho prestado deve ser igual na sua natureza, qualidade e quantidade (o que, às vezes, não é tarefa fácil de demonstrar).

sexta-feira, 15 de abril de 2011


ROLETA RUSSA DIVINA
(Ou o mistério da criação)
Deus criou o universo e o homem como um jogo para se distrair da monotonia da eternidade
Perguntamos, muitas vezes, qual seria a lógica da existência do homem sem a fé na existência de um deus. Mas porque não perguntar qual seria a lógica da existência de deus se ele não criasse nada. Então, num dado momento da sua longa eternidade, decidiu criar qualquer coisa, tipo um universo com umas esferas a girar no espaço profundo e alguns seres vivos, dotados de mais ou menos inteligência que lhes permitisse adaptarem-se àquele universo. Mas, já agora, pomos algumas questões prévias a esse acto de criação; como saber, por exemplo, porque é que deus resolveu criar o universo e o homem naquele preciso momento em que o fez (admitamos que por ocasião do big bang) e não em qualquer outro momento anterior da sua eternidade? E, desde esse acto criador até ao presente não criou mais nada? Ou não virá a criar?
Perguntarão alguns, todos os crentes em deus e especialmente todas as hierarquias das igrejas, que interesse têm estas questões para a fé. De facto, não têm; para quem acredita, não interessa fundamentar racionalmente a sua fé, porque a fé é, segundo dizem, um dom de deus e, portanto, ou se tem ou não; e mais, felizes dos que têm esse dom e infelizes de quem o não tem. Posto o problema nessa vertente, seria estultícia minha tentar pensar, raciocinar ou debater esse tema. De facto, os crentes, igrejas e hierarquias respectivas, sempre difundiram a sua fé e pretenderam convencer os “pagãos” da bondade da mesma, usando argumentos morais, históricos, mas também argumentos racionais. E todas as crenças e igrejas o fizeram historicamente como se o seu deus, crenças e sistemas fossem os únicos verdadeiros, fiáveis e salvadores. Mas, ao contrário, já não aceitam que aqueles “pagãos” discutam a crença no seu deus com argumentos racionais e lógicos, como se todos estes tivessem de aceitar o seu sistema sem discussão ou mesmo sem hipótese de duvidarem, mesmo que no seu íntimo.
Corolário máximo dessa impossibilidade de discutir racionalmente as crenças fundamentais do cristianismo é o fenómeno da transubstanciação (a mudança da substância do pão e do vinho no corpo e no sangue de Cristo, no acto da consagração), aceite pela igreja católica, ortodoxa e anglicana e nova apostólica. Fenómeno para além de toda a capacidade de compreensão humana, que tanto interessa aos crentes cristãos como ponto central da sua fé; mas fenómeno indiscutível para esses mesmos cristãos e totalmente incompreensível para todos os não crentes. Nesse contexto, não é só a fé que é indiscutível, mas toda a prática religiosa associada à mesma. Todas as crenças e todos os “mistérios” da fé não são demasiado importantes, em si mesmos, para os não crentes; apenas o são na medida em que os crentes caem em círculos viciados de pensamentos, raciocínios e conclusões que apenas são válidos para que tem fé, mas, depois, não conseguem interagir em termos quer de pensamento quer de comportamento com aqueles que não estão integrados no seu sistema “perfeito”.
Verdade é que não aceitam que a discussão se ponha nesse ponto e com essa metodologia porque sabem que não têm respostas para todas as questões levantadas por espíritos livres da sua ditadura intelectual.
Num ponto concordo com eles, é que a fé não é racional, não tem qualquer fundamento lógico, nem a existência de deus é demonstrável axiologicamente. Perguntar-se-á então porque é que, desde sempre, o homem teve necessidade de acreditar num deus qualquer e, porque é que, de facto, a maioria das pessoas, em todos os tempos, acreditou na sua existência. Haverá explicações diversas a começar pelas próprias igrejas e crenças que dirão que esse facto é, desde logo, prova da existência de deus, numa lógica de incluir o significando no significado, isto é, é assim porque é. Haverá explicações sociológicas, filosóficas, físicas e outras. Para mim há uma explicação que valerá tanto como as outras porque é fruto mais da reflexão e observação da natureza humana e do próprio fenómeno da fé, vivido, em concreto, pelas pessoas. Será uma explicação de cariz sociológico. É pacífico que a natureza humana é frágil, quer ao nível da integração no espaço físico onde está instalada, quer ao nível da integração social e profissional; a natureza de cada indivíduo é pouco resistente ao nível de exigência que a natureza lhe coloca, obrigando-o a esforços enormes para se manter integrado no grupo, na família, na empresa e, em geral, na sociedade. Essa integração requer um esforço constante e difícil quer ao nível físico quer ao psicológico. E toda a pessoa precisa, para tentar sobreviver, de recorrer a ajudas diversas. Sabe-se que o princípio geral para a sobrevivência de toda a natureza (seres vivos ou …) é a capacidade de adaptação ao meio em que estão inseridos; os que conseguirem adaptar-se terão todas as hipóteses de sobrevivência e os que não se adaptarem não sobreviverão. Ora, na minha perspectiva, a fé é um meio de adaptação ao meio hostil em que todas as pessoas se movem; é uma forma de a existência (concreta, do dia a dia) se manter a um nível suportável; desde logo, esta tese fundamenta-se na história das crenças do homem que começaram por acreditar e adorar fenómenos da natureza: o sol, o vento, o mar, etc; todos com as mesmas características: com expressões poderosas, misteriosas (à data), com capacidade de produzir efeitos terríveis e benéficos e, não menos importante, de influenciar, para o bem e para o mal, todos os acontecimentos da vida das pessoas, mesmo os mais insignificantes. A essa luz da compreensão da crença dos antigos nos seus deuses, a crença actual no deus de todos os crentes, sejam cristãos ou não, tem a mesma fundamentação psicológica e sociológica, ou seja, o deus dos cristãos é um ser poderoso, misterioso, que castiga, que premeia e que determina todos os acontecimentos do mundo e da vida das pessoas, por mais insignificantes que sejam.
Fenómeno espantoso é aquele que leva os crentes a rezar pela felicidade dos seus entes queridos, para a cura numa doença grave, mas também para ganharem dinheiro nos negócios, para o seu filho ter êxito nos exames, para que o seu clube ganhe um qualquer jogo, num pressuposto infalível (para eles) de que deus intervém em todos os actos e momentos da sua vida, para os proteger (é praticamente o regresso ao ventre materno, como porto seguro contra todas as intempéries). Não deixa de ser um egoísmo e oportunismo descarado, porque alguns até pensam que o seu deus os ajuda a eles e não aos outros que não acreditam nele.
A fé é, assim, o instrumento necessário para a sobrevivência humana, para poder ultrapassar todas as dúvidas, todas as emoções negativas; tanto assim é que, há quem defenda que no genoma humano há um gene da fé, como elemento indispensável à sobrevivência da humanidade (organização e respeito pelas normas impostas).
Voltando à tese inicial, deus criou o universo e o homem; e propôs-se um jogo: dava vida eterna ao homem, mas a felicidade ou infelicidade dessa eternidade dependia do desempenho durante um curto período de 40, 60, 70 ou pouco mais anos. Nesse curtíssimo período de experiência, o homem tinha de demonstrar se merecia ou não ser feliz por toda a eternidade. E estabeleceu algumas regras do jogo às quais o homem tinha de obedecer, tipo rally paper. Por exemplo, quem quisesse ser feliz por toda a eternidade, não poderia matar, roubar ou fornicar a mulher do vizinho. Mas como em qualquer jogo, decorridos uns tempos (no caso, uns milhões de anos) alterou algumas regras. Mandou o filho à frente que introduziu alguns bónus e penalizações; aqueles, dependentes do desempenho e estes do mero acaso; por exemplo, quem quisesse ser feliz na eternidade teria que ser submetido a um pequeno ritual de um banho acompanhado de umas palavras mágicas; quem não se submetesse a esse ritual não seria feliz, mas também não seria infeliz. Quer dizer, em princípio estaria condenado, mas … como a misericórdia de deus é infinita, teria sempre uma hipótese de salvação.
Criou também uma escola para formar formadores que teriam a obrigação de impor e vigiar pela aplicação das novas regras, com mais bónus e penalizações. Aqui entramos na actuação da igreja, ao longo dos séculos, a qual desenvolveu imensas variações àquele jogo, com alguns bónus, mas, especialmente, com múltiplas penalizações.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Meu Deus, se eu tivesse um pouco de vida...

"Se por um instante Deus se esquecesse de que sou uma marioneta de
trapo e me oferecesse mais um pouco de vida, não diria tudo o que penso,
mas pensaria tudo o que digo. Daria valor às coisas, não pelo que valem, mas pelo que significam. Dormiria pouco, sonharia mais, entendo que por cada minuto que fechamos os olhos, perdemos sessenta segundos de luz.
Andaria quando os outros param, acordaria quando os outros dormem.
Ouviria quando os outros falam, e como desfrutaria de um bom gelado de chocolate!
Se Deus me oferecesse um pouco de vida, vestir-me-ia de forma simples, deixando a descoberto, não apenas o meu corpo, mas também a minha alma.
Meu Deus, se eu tivesse um coração, escreveria o meu ódio sobre o gelo e esperava que nascesse o sol.
Pintaria com um sonho de Van Gogh sobre as estrelas de um poema de Benedetti, e uma canção de Serrat seria a serenata que ofereceria à lua.
Regaria as rosas com as minhas lágrimas para sentir a dor dos seus espinhos e o beijo encarnado das suas pétalas...
Meu Deus, se eu tivesse um pouco de vida...
 Não deixaria passar um só dia sem dizer às pessoas de quem gosto que gosto delas.
Convenceria cada mulher ou homem que é o meu favorito e viveria apaixonado pelo amor.
Aos homens provar-lhes-ia como estão equivocados ao pensar que deixam de se apaixonar quando envelhecem, sem saberem
que envelhecem quando deixam de se apaixonar!
A uma criança, dar-lhe-ia asas, mas teria que aprender a voar sozinha.
Aos velhos, ensinar-lhes-ia que a morte não chega com a velhice, mas sim com o esquecimento.
Tantas coisas aprendi com vocês, os homens...
Aprendi que todo o mundo quer viver em cima da montanha, sem saber que a verdadeira felicidade está na forma de subir a encosta.
Aprendi que quando um recém-nascido aperta com a sua pequena mão, pela primeira vez, o dedo do seu pai, o tem agarrado para sempre.
Aprendi que um homem só tem direito a olhar outro de cima para baixo quando vai ajudá-lo a levantar-se.
São tantas as coisas que pude aprender com vocês, mas não me hão-de servir realmente de muito,
porque quando me guardarem dentro dessa maleta, infelizmente estarei a morrer..."

GABRIEL GARCIA MARQUEZ

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Angústia ao fim da tarde

Estava um fim de tarde em tons cinza e sonolento; o tempo escoava-se lentamente, sem sequer ser perceptível que passava; as nuvens pareciam estar imobilizadas há dias, não soprava a mais pequena brisa e nem as folhas das árvores, nem as flores, nem mesmo aquelas nuvens se moviam; mas, talvez contraditoriamente, sentia-se um ar carregado de tensão como se a natureza estivesse prestes a explodir; sentia-se um cheiro que mal se identificava, porque era uma mistura de queimado e podre, o que dava um tom lúgubre àquele fim de tarde.
Naquele momento, ela estava sentada no terraço, com as mãos pousadas nas coxas, tão imóvel como a natureza. A sua cabeça não se mexia, como parecia não se mexerem os olhos e todo o corpo; parecia parte integrante daquela natureza  que se afigurava morta, mas que ameaçava despertar a qualquer momento. Havia uma tal identificação com a natureza que nem as nuvens reflectidas nos seus olhos lhe davam qualquer vida. No entanto, o seu rosto parecia conter a história de toda a sua vida, todos os sentimentos, emoções, lágrimas e risos, vitórias e derrotas; e isso, apesar de parecer confundi-la, dava-lhe uma expressão de coragem inexplicável, como tentando viver tudo o que nunca vivera, sentir o que sempre reprimira, provocar o que sempre calara, experimentar o que antes  achara fútil; mas, repentinamente, o seu rosto crispou-se  e criou uma máscara de medo; medo que fosse tarde, de não ter tempo, de envelhecer precocemente. Estava naqueles pensamentos, quando, lá fora, começou a cair uma chuva miudinha e isso provocou-lhe uma sensação estranha, um aperto no ventre e uma angústia asfixiante. E começou a chorar, devagarinho, em silêncio, como a dizer que compreendia a natureza na sua dor, sentindo que aquela dor as imobilizava, a ela e à natureza.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

O que une os homens? A fé ou o laicismo?

A pretensão totalitária do dogmatismo da igreja católica

Na visita pastoral que o papa fez em 2010, a Espanha, declarou perante os bispos: "... laicismo, ideologia que leva gradualmente, de forma mais ou menos consciente, à restrição da liberdade religiosa, promovendo o desprezo ou a ignorância pelo que é religioso, relegando a fé para a esfera dos interesses  privados, retirando-lhe o carácter da sua verdadeira expressão pública e colectiva."

Na mesma viagem, o papa, entre outras, fez a seguinte afirmação: "viver sem deus é como viver sem sol".

Não me quero alongar em comentários, mas, como ateu e laicista, só denuncio a pretensão totalitária do dogmatismo religioso, neste caso da igreja católica, que cultiva e incute o princípio de que a felicidade, o bem, o amor, em suma, todos os valores positivos estão do seu lado e naqueles que a seguem. Os outros, os infiéis, são uns infelizes que se arrastam sem fé e sem esperança, ao longo desta triste vida (enquanto não são, por eles, convertidos).

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Boletim paroquial!! O que é isso?

Da folha semanal inter-paroquial de Eirol e N. Sra. de Fátima: "o ateísmo é uma atitude adoptada por alguma gente, quer por ignorância, quer por falta de investigação séria. É que o ateísmo torna a vida mais fácil, sem contas a prestar pelo bem ou pelo mal, sobretudo para estes."

Este boletim não foi publicado em 1498, mas em 27/06/2010.
Gostei especialmente da expressão "por alguma gente", mas não percebi se essa gente também será filha de deus.
Mas também gostei daquela da "investigação séria". Já estou cansado de ver cristãos a investigar (seriamente) para fundamentar a sua fé. Desculpem-me os meus amigos cristãos.
Voltarei a este artigo proximamente. Esta pérola merece.